terça-feira, 17 de novembro de 2009


Primaverão florir...

PRIMAVERÃO OUTUBRECER.

Quando outubro
primavera-se em brisas
a despertar das cinzas
as brasas de junho,

o poeta re-colhe (então)
no ar, o perfume
dos cajueiros em voo
em pleno verão.

E carregado de janeiros,
de borboletas abelhudas,
ele amanhece vespertino;
aquela palavra fruta

pão de sua vida, arte
que se reparte: madura escrita.

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

ART GOTH

Cultivar na árvore
a semente futura,
em flores desabrochadas
o fruto maduro.

Contemplar estrelas
numa mínima centelha,
e miríades de mundos
num grão de areia.

Desejar a eternidade
dos momentos gostosos,
e ao amor gozar
na infinitude dos instantes.

Um Visgueiro... pai da mata.

A SENHORA DO VISGUEIRO

Em um canto esquecido
de um jardim selvagem,
depois das chuvas de janeiro,
entre musgos e pedras,

um anjo escarlate desce
num talo de grama verde clara;
para colher um buquê de orvalho
à Senhora do Visgueiro.

O Visgueiro, pai da mata,
que abriga em alta copa
miríades de seres, globu-
lares e pendentes flores vermelhas,

sabe que o anjo escarlate pretende
luzir seu carinho à Senhora
e ao Vigueiro, ancestral árvore,
compartilhar sua alegria telúrica...

em um en-cantado jardim selvagem
depois das chuvas de janeiro.

domingo, 15 de novembro de 2009

INTEGRIDADE (a partir de um poema de Ricardo Reis)

Em tudo, sê inteiro...
Nada que fazes, escape
a verdade para contigo!

Pois nisso revela-se
aquela beleza
que há por toda parte:

a lua cheia, alta brilha
na noite escura,
no mar e numa poça d'água.

quinta-feira, 5 de novembro de 2009




















Igreja de São Patrício (Tara, Irlanda... a terra do sonho).

DA ESPERANÇA (a partir de um sonho...)

Na noite mais escura,
nas paragens noturnas dos sonhos,
minha alma passeia
sobrevoando as brumas de Tara.

Do alto, sobre a névoa,
vejo luzes pálidas
de uma antiga cidade,
e no seu centro... uma capela.

Desço ao chão e pelo vitral
entro no interior penumbrado,
tocado pelas luzes delicadas
de círios acesos aos santos.

Na nave central, um grupo passeia
peregrinando seus olhares...
enquanto um jovem padre
relembra a antiga história do templo.

Então alguém pergunta
pelas origens da gótica capela...
e o padre com emoção conta
uma curiosa história envolta em cena:

“Nas manhãs do tempo, antes
dos antigos nos escreverem seus feitos,
foi para cá destacado um zelador
para guardar e cuidar da capela.

Vindo de longe, sendo estrangeiro,
pode perceber coisas que a gente
do lugar não percebia de tão perto:
havia em todos um fatídico medo da noite...

um medo tremendo: um medo
que a noite não mais os deixasse... e por isso
velavam insones, no escuro dos interiores
dos seus lares, pela chegada do dia novo...

Isso, dia após dia, foi tomando
o zelador de uma tristeza e com-paixão
ele foi arquitetando um plano
para que todos acreditassem n’a-manhã.

Então, num dia qualquer, depois disso,
ele construiu um engenho mecânico...
um carrilhão de pássaros que cantavam
na hora mais escura da noite;

para que assim, os moradores pensassem
que a aurora era chegada... e tranqüilos dormissem;
matando o medo no seus corações;
tomados pelo medo que o sol não mais voltasse.

Assim foi... por anos: o carrilhão cantava
as vozes dos pássaros anunciando a aurora...
e os moradores, dessa forma, venciam o medo
e novamente dormiam, despertando seus sonhos.

Mas, o inevitável aconteceu... silenciando
a voz do zelador, já velhinho; e com ele
seu engenho tão zelosamente mantido
na torre da capela de Todos os Santos.

A vila toda correu pra velar pelo imóvel
corpo do zelador, amigo de todos e de todos
veio de novo visitar o antigo medo:
‘quem haveria agora de anunciar a aurora?’

Silenciava no peito de todos a aflição
que novamente a noite não os deixasse,
já que não havia quem operasse o carrilhão
dos pássaros, silenciados pela morte...

Então um murmúrio de preces invadiu a capela,
onde o velho corpo era velado, com carinho e saudade,
feito de dor e medo, angustia e piedade,
mãos vazias entregues aos céus, corações apertados...

Então, algo estranho aconteceu... como milagre
um revoar de pássaros da alvorada cantavam em plena noite...
e todos perceberam que não estavam sozinhos
pois nunca estiveram: os pássaros lembravam Algo.”


Então os peregrinos na capela
agradeceram ao padre pela história
e em paz voltaram para suas cidades sabendo
porque aquela igrejinha era a catedral da cidade.

Um outro padre que a tudo escutava
encostado em uma coluna, não muito distante,
observou o ir dos peregrinos... e disse,
por entre o enfado e a piedade:

“Jorge, caro amigo, por que ainda contas
essa antiga história ?... Hoje nela ninguém
mais acredita... não perca seu verbo, caro amigo!”
O outro, acolhendo com doçura

aquelas palavras, disse com serenidade:
“Mais do que nunca é preciso cantar na noite
os sonhos feitos com engenho e arte, para assim
despertar neles novamente uma luz...quem sabe.”

NA PENUMBRA DO TEU CORAÇÃO...

Na penumbra de teu coração,
caverna de fogo e água,
deita tua carne fatigada
na relva serena da terra...

E vê o murmurar das ondas,
vozes de tantos cantos,
a dizer do ir e vir da vida
no fluir tranqüilo do imenso;

Escuta o silêncio das pedras,
sua solidão e firmeza de rocha,
aquilo que permanece e dita
a idade das Eras, as trilhas antigas...

Deixa que o vento te abrace
e agite teus cabelos e sonhos:
ele sabe coisas do ar e do tempo,
coisas de longe... e de tão perto.

Ouve no silêncio da noite
aquela palavra que nos falta
e d-escreve serenamente
a poesia possível da graça.

Diante do árido barulho
da tempestade que ameaça
confia no vagar das ondas,
no vai e vem do oceano.

Se a solidão te acompanhar
vela entre estrelas e a lua;
canta ao vento, dança na chuva...
e acompanhado celebra tua vida.

Por isso, a vida é uma oportunidade;
um convite aberto ao horizonte,
uma possibilidade de encontro entre
nós e o coração da terra: tua carne.

terça-feira, 3 de novembro de 2009


Sobre a flor silvestre... o fundamental detalhe.

O PRAZER DAS PEQUENAS COISAS (fragmentos)

(...)
A criança interior
inscrita na carne,

os prazeres pequenos
de tão grandes,

a alegria simples
das pessoas humanas,

o copo de água
e a fruta madura;

o doce beijo,
o abraço da verdade...

A SAUDADE

A saudade é ilha solta
no mar das lembranças...
ondas a deriva do mar,
ostra caprichosa a guardar
as pérolas da memória;

A saudade é lento passar do vento
a sussurrar outonos tempos...
para assim, quando na primavera
de novo nos encontrarmos,
em verões ancestrais,
novamente sermos... e-ternos.

Inishimore... e seu mar selvagem.

http://www.youtube.com/watch?v=4ocTj_G7r6Q

AO CAMINHO COM O MESTRE

Por entre noites e flores,
deixo contigo um aceno
feito de saudade.

No caminho nosso,
a tua caminhada
me faz seguir andante...

saber que me acompanhas
me faz seguir confiante:
sinal da espiritualidade
que nos move, nos comove...
que graciosamente nos apaixona.

SAMHAIN

Por entre as brumas, o vento nos fala
de outros tempos, outras brisas...
o fogo ilumina os passos daqueles
que passam pelas trilhas,
enquanto os portais se abrem
aos que nunca deixaram a senda...

Na superfície do lago da alma
a bruma dos tempos passa...
e a luz dos caminhos se abre
aos pés dos peregrinos
anunciando pela voz dos bardos
a memória de nossa tribo,
a lembrança de outros tempos,
a esperança de novas Eras.

Diante da luz que nos alumia,
vivo entre os vivos, festejamos
a ressurreição das vozes que somos:
ancestrais acordes de uma harmonia
no telúrico coração humano.

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